Banca digital – o caminho irreversível a seguir

É preciso contextualizar e compreender o que está a mudar na indústria financeira e na indústria de meios de pagamento, para concluir o óbvio, a tomada de decisão sobre a banca digital, concretamente:

  • Comportamento da Banca

Os Bancos estão diferentes após a maior crise dos últimos 80 anos. Os lucros dão lugar a prejuízos por isso: (i) racionalizam-se os custos (ii) agilizam-se os processos de negócio (iii) libertam-se as actividades não core. O foco do crédito também mudou: financiam-se os bens transaccionáveis em detrimento dos não transaccionáveis. O foco do volume é substituído pela rentabilidade.

  • Pressão Regulamentar

O Legislador e Regulador, externo e interno, após o “tsunami financeiro” despoletado em 2007 pela crise do sub-prime e, em especial, desde 2009, despoletam um verdadeiro “tsunami regulatório e legislativo”, que se está a tornar esmagador do modelo negócio da indústria financeira.

Pese embora a pressão regulamentar e legislativa, constata-se que se mantém o gap desta face à evolução tecnológica, cada vez mais digital, o que dificulta a acção do compliance no que se refere às boas práticas de Know Your Customer (KYC). É preciso permitir novas formas de identificação biométricas do cliente, facilitadoras nas suas relações contratuais (reconhecidas também em processos judiciais, se for o caso). O KYC presencial deve evoluir para um KYC digital/remoto (entenda-se autenticação on-line: identidade, verificação e autenticação). A mesma pressão regulatória não é exigida aos novos players tais como a PayPal, Google, Amazon, Apple, Facebook, etc.

  • Poder negocial dos novos players / comerciantes / outros

Os novos players, os fabricantes de tecnologia, as operadoras e os comerciantes, pretendem a todo o custo substituir-se à Banca na prestação do serviço de transaccional. Porquê? A possibilidade de iniciar pagamentos sem recurso a uma conta bancária é uma realidade, seja por via das wallet, seja por via dos pré-pagos, seja por via do mobile, o que permite o aparecimento de novos players concorrentes (PayPal, Google, Amazon, Apple, Facebook). São disruptivos na forma de simplificar, automatizar e “industrializar” a eficiência das operações transaccionais e a experiência de consumo / venda.

  • Comportamento do Consumidor

O cliente está mais consciente e pretende um controlo orçamental das suas despesas e encargos pelo que apresenta menor apetência para o consumo, antecipa liquidação de encargos (os de taxa de juro mais elevada), exige maior informação comparável, apresenta maior sofisticação de conhecimentos (educação e literacia financeira).

O cliente desloca-se ao mundo físico da banca, por questões de compliance que considera “burocracia da banca” ou por aconselhamento financeiro. Genericamente prefere obter conselhos na comunidade on-line em detrimento de se deslocar a uma agência para dialogar com o seu gestor de conta (simultaneamente equaciona porque não recorre ao skipe nestas interações). No que respeita ao seu dia-a-dia, pretende um fácil e robusto acesso remoto. Se por um lado o cliente pretende que o seu dinheiro esteja em segurança, por outro, procura cada vez mais ajuda para as decisões financeiras transaccionais do seu dia-a-dia adequadas à sua mobilidade (hora, lugar, canal utilizado). No fundo, pretende afirmar “o Banco está sempre comigo!”.

O mundo digital não é um canal mas é o seu modo de vida seja na transacção bancária ou na sua interacção em sites sociais. É um verdadeiro nativo digital. O Mobile influencia e muda o seu comportamento e potencia a sua actividade comercial junto dos comerciantes.

  • Desenvolvimento da Tecnologia e Mobilidade

A plataforma digital apresenta o elevado potencial de se tornar o ponto de convergência entre os mundos físico e digital. Por exemplo, entramos numa loja, verificamos fisicamente o nosso produto (“showroom”), comparamos preços on-line e utilizamos o mobile para pagamento da compra (onde, quando e como desejar).

A tecnologia potencia a mobilidade e novas formas de comunicar. Hoje toda a evolução está a convergir para um único equipamento de elevada conveniência – o smartphone, através do qual é possível: (i) integrar diversas tipologias tecnológicas como sejam o GPSGlobal Positioning System/Geolocalização, Bluetooth, Contactless / NFCNear Field Communication, SMSShort Message Service/USSD – Unstructured Supplementary Service Data, Quick Response Code – e Web- World Wide Web  (browser) (ii) o acesso a diversas alternativas de transacção como sejam o Mcommerce, Mpayment, Mwallet (desmaterialização do cartão físico) e acesso ao Social Commerce e (iii) o desenvolvimento de Apps facilitadoras da relação de fidelização entre consumidores e empresas.

O Mobile / Smartphone é, sem dúvida, um ponto de convergência entre o mundo físico e digital, com impacto nas vendas e na distribuição, que permitem maiores opções aos clientes e comerciantes, com duas variantes muito importantes:

Mobile Banking

Permite ao cliente realizar as operações tradicionais do homebanking, através de uma autenticação on-line, ou mesmo de uma app específica a desenvolver, através da qual efetua um depósito de cheque remoto (ex: USSA Bank), a gestão de contas poupança e de contas cartão, pagamentos de serviços, consultas diversas (saldos, movimentos, câmbios, bolsa, etc), entre outras funcionalidades.

Mobile Payments

Permite aos clientes o pagamento digital realizado através de internet em actividades comerciais. No caso do mobile o cliente usa o telemóvel como método de pagamento, em real time, a saber:

Mobile Commerce (m-commerce)

Permite ao cliente, à semelhança do e-commerce (electronic commerce) realizar transacções on-line de retalho, viagens, digital downloads e vendas C2B – consumer-to-business (no comércio, ex: Aplle, Amazon), C2C – consumer-to-consumer (ex:eBay) e G2C – government-to-consumer (ex: salários e pensões).

Mobile P2P – Peer-to-Peer (entre pessoas)

Permite ao cliente, se explorado numa lógica da sua rede relacional, por exemplo, transferir dinheiro entre família e amigos (incluindo na rede social do facebook).

Peer-to-Peer é um conceito que resulta do desenvolvimento de arquitetura de redes de computadores onde cada um dos pontos ou nós da rede funciona tanto como cliente quanto como servidor permitindo compartilhar músicas, vídeos, imagens, dados, enfim qualquer coisa com formato digital, inclusive, os pagamentos, usando como denominador comum o email ou o número de telemóvel.

Ainda neste conceito, o mobile pode ser usado como substituição de POS – Point of Sale (m-POS), através de mobile card readers (ex:PayPal, iZettle, Square) ou, via NFC (Near Field Comunication – Contactless), através de acesso remoto com ligação à conta bancária ou a cartão guardado em wallet digital.

A alteração de comportamento do cliente, enquanto consumidor da banca, obriga a ultrapassar barreiras de décadas de procedimentos, processos, tecnologias e políticas, em troca de simplicidade a toda a hora, em qualquer momento, melhorando desta forma a experiência de consumo. As tecnologias digitais e mobile são essenciais para continuarem a assegurar segurança, rapidez, simplicidade e conveniência. É muito importante “agilizar” o processo de identificação e sua validação, em coordenação com as Equipas de Sistemas de Informação e Compliance, uma vez que os processos de “on-boarding” e de navegação (possibilidade de realização de operações), são fundamentais para promover boas experiências de relação remota com os clientes.

“Pensando digitalmente” é preciso permitir que os processos de negócio (operações) sejam transversais e flexíveis aos diversos canais e que se ajustam ao novo perfil electrónico do cliente. Numa lógica multicanal devem permitir iniciar um processo num canal e terminá-lo noutro. Devemos lembrar-nos que são os clientes que determinam qual o canal a usar em função da sua conveniência.

A banca tradicional tem, forçosamente, de evoluir e “romper” com a actual forma de “fazer banca”. Não tem opção quanto ao futuro canal de interacção com os seus clientes: ou acompanha o mobile / banca digital ou estará fora de mercado. Será irreversível a aposta no Mercado Global (Digital) ao invés do Mercado Local (Agência). Esta aposta terá consequências na estrutura da organização, dos modelos de negócio, dos produtos e serviços, dos processos (transversais aos diversos canais) e na informação analítica geradora de criação de valor.

Não se pode esquecer o enorme desafio de transformar os elevados volumes de dados, cada vez mais dispersos em diversos canais, em informação geradora de valor em real-time, que representa o conhecimento do cliente, o principal capital de uma empresa, para se poder vender o produto certo, ao cliente certo, na hora certa.

Digital

Seguir o “novo (?) caminho digital” permitirá servir melhor os diversos segmentos de mercado, reduzir o cost-to-income e incrementar a rentabilidade dos clientes. Adiar esta tomada de decisão é estar a ignorar, ou mesmo a hipotecar, o futuro da banca ainda muito tradicional.

Nota: republicação do texto original publicado em 10/11/2014.

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