Num mundo em que diariamente se consome “digital”, considero oportuno recordar que a humanização da relação comercial envolve pessoas. Quem são estas pessoas? Todos os colaboradores da empresa.
Considero que todos os colaboradores de uma organização, sem exceção, são comerciais. E se não o são, devem urgentemente passar a sê-lo. Porquê? Porque as áreas de back-office, middle-office e front-office, são co-responsáveis pelo sucesso e crescimento das vendas da empresa.
Praticar uma cultura corporativa “customer-centric” significa que todos os colaboradores devem estar constantemente focados na experiência de consumo que se proporciona ao cliente, nos diversos pontos de contacto que estabelecem com a empresa (touchpoints).
As soluções que criamos em canais digitais (on-line ou aplicativo móvel) e em canais físicos (face-to-face, imagem ou voz) devem servir mandatoriamente os interesses do cliente ao invés do que é mais cómodo para a organização e/ou para os seus colaboradores.
Uma experiência de consumo positiva permite realizar vendas de forma recorrente, geradoras de receitas e de criação de valor. Só as vendas recorrentes asseguram a sustentabilidade do negócio.
As áreas de produção, as áreas tecnológicas e as áreas comerciais devem ajudar o cliente a maximizar a sua satisfação no momento em que consomem (na compra e pós-venda) os bens e serviços da empresa.
A tecnologia facilita o acesso do cliente à empresa, pela internet ou pelo mobile, através de Plataformas abertas, API (application program interface) ou APP (abreviativo de application).
Se pensarmos em exemplos como a Amazon (maior distribuidor mundial sem ter lojas físicas), Facebook (maior empresa de conteúdos sem criar nenhum), Airbnb (aluga imóveis sem ser proprietário de nenhum) e a Uber (empresa de transportes sem ter viaturas) concluímos que são modelos de negócio suportados em plataformas tecnológicas facilitadoras do negócio de bens e serviços, pela via da aproximação entre a oferta (vendedor) e a procura (comprador).
No entanto, apesar da relação comercial se iniciar pela via digital o negócio é, em si mesmo, muito físico. Observe-se a logística de entrega física dos produtos comprados on-line (amazon), os conteúdos criados pelos utilizadores (facebook), a existência de imóveis para arrendar (airbnb) e a existência das viaturas de transporte utilizadas em serviço de táxi (uber). A compra desmaterializada no “mundo digital” implica a existência de uma estrutura de pessoas no mundo físico, ainda que em menor quantidade, para assegurar o cumprimento da promessa da empresa.
O alinhamento das experiências digital e física que se proporciona ao cliente determina a sua satisfação ou insatisfação com a empresa, a sua recomendação junto de familiares e amigos (“boca em boca” ou “likes e shares”) e a sua fidelização (a recompra de bem ou serviço).
O Cliente determina a sua satisfação ou insatisfação, quando compara a expetativa que detém sobre um determinado nível de serviço (a qualidade que espera receber) com o valor que capta do mesmo (a qualidade que percepciona / recebe).
A perceção ou qualidade fornecida está directamente relacionada com o valor incorporado no bem ou serviço, a empatia estabelecida, o tratamento personalizado, a atitude, a cortesia e a importância dada ao cliente.
A expectativa ou qualidade esperada está directamente relacionada com a inovação tecnológica, imagem, marca, recomendações e preço. A simplicidade, segurança e conveniência são também factores que o cliente tem em consideração.
A actividade comercial caracteriza-se pois, pela oferta da máxima qualidade, em níveis de serviço que excedam as expetativas dos Clientes, nos diversos momentos de verdade! De acordo com Jan Carlzon (Chief Executive Officer of the Scandinavian Airlines System Group from 1981 – 1994), são momentos de verdade, aqueles em que o Cliente entra em contacto com o serviço e em que suas expetativas e necessidades são atendidas ou não.
Atualmente, o cliente toma contacto com as empresas no “mundo digital”, internet ou redes sociais, gosta do site, faz um like / torna-se seguidor na página do facebook, twitter ou outra rede social, faz o download da app (experimentação), aceita as notificações push e permite o acesso à sua localização. Quando precisa de fazer negócio, tem a expectativa de realizar uma compra simples com pagamento integrado e receber o bem ou serviço em casa ou no escritório, no timing acordado / prometido. Espera acompanhar a logística física do serviço através de emails, sms ou notificações. Finalmente, caso deseje, pretende ter acesso a pessoas da empresa (loja, chamada ou vídeo).
Recorrendo ao exemplo da banca, o cliente relaciona-se com o banco, nos seus mais diversos “touchpoints”, como seja o recurso às instalações físicas do banco ou empresas associadas do grupo financeiro (por ex. empresas de crédito especializado, banco de investimento ou companhia de seguro), o uso dos seus cartões de débito e crédito em TPA – terminal de pagamento automático) e CA – caixa automático (no país ou no estrangeiro), o uso do mobile e do homebanking (em qualquer local e hora), o uso do telefone (para a agência ou para a linha directa de atendimento), através da publicidade (rede social, televisão, rádio, outdoors), merchandising e, o mais importante, na interacção que estabelece com o colaborador que lhe presta o serviço, nas mais variadas circunstâncias, incluindo as situações de reclamação.
Por vezes, o valor de excelência incorporado no bem ou serviço pode ser ameaçado e / ou destruído pela interacção menos apropriada de um qualquer colaborador da empresa com o cliente. Da mesma forma, um processo digital que seja complexo e criador de atrito afasta o cliente obstruindo a venda.
É suficiente uma situação negativa para provocar o abandono do cliente. Os custos de mudança são hoje cada vez menores num mundo de concorrência à escala global.
Como concluímos, a gestão das expetativas é mesmo da nossa responsabilidade! A tecnologia transforma os processos de negócio em “commodities”. As pessoas continuam, pois, a garantir a diferença. Numa mesma marca, em uma qualquer indústria, o cliente está satisfeito ou insatisfeito, dependendo do comercial (qualquer colaborador) que com ele se relaciona nos diferentes canais físico ou remoto, numa qualquer parte do mundo (global brand).
Devemos recordar que as empresas são compostas por pessoas, pessoas estas que fazem a diferença na humanização da relação comercial estabelecida.
A nova cultura digital é fundamentalmente uma nova abordagem de gerir a cadeia de valor de produtos e serviços em função das necessidades do cliente. Trata-se da forma como humanamente nos relacionamos com o cliente através dos diferentes canais (a experiência entregue), incluindo o canal digital.
Só uma boa gestão de expectativas, relacional e emocional, assegura relações sustentáveis e de fidelização de clientes.