As empresas tradicionais estruturaram os seus processos no pressuposto do cliente estar fisicamente presente. A automatização das tarefas tinha em mente a “standardização” de processos internos de atendimento tais como a encomenda, a produção, a comercialização ou os serviços pós-venda.
A informatização era suportada em mainframes, um “computador de grande porte com capacidade para prestar serviços de processamento a múltiplos utilizadores que lhe estão ligados diretamente ou em rede” e em diversas aplicações, geralmente, não integradas ou sem comunicação entre si.
O conhecimento do cliente era construído periodicamente com base em documentação original, apresentada fisicamente para ser fotocopiada, e com base no conhecimento pessoal que o comercial acumulava, fruto da relação de proximidade que com ele estabelecia. Os contratos e ou instruções eram assinados presencialmente, em duplicado ou triplicado, em suporte papel.
A dinamização de produtos era o foco da comunicação de marketing com o objetivo de potenciar as vendas das diferentes linhas criadas para cada segmento de mercado.
A comercialização era suportada em rede de distribuição física – loja ou postos de atendimento, a capilaridade física do produto, com a alocação de inúmeros comerciais e prospetores de negócio.
Os canais foram-se desenvolvendo com o passar dos anos mas o modelo de negócio centrado no produto manteve-se na mesma assim como o suporte físico da venda.
Múltiplos exemplos são conhecidos em setores tradicionais como sejam a banca, as telecomunicações, a energia e tantos outros. Inclusive, o próprio setor público.
O que está a mudar com o digital?
A tecnologia permite repensar os processos de negócio facilitando o acesso aos mesmos ou por solicitação dos clientes (externa) ou por solicitação dos colaboradores (interna) a partir de um qualquer canal.
Os processos de negócio da empresa passam a estar continuamente disponíveis a partir de um qualquer colaborador da estrutura interna (serviço de back-office, middle-office ou front-office) ou da estrutura externa (qualquer cliente ou outro stakeholder).
A tecnologia permite também o acesso ao tratamento de informação em tempo real. Desta forma, galvaniza-se a criação de valor a partir deste ativo core da empresa, ainda tão pouco explorado e ou rentabilizado.
O conhecimento do cliente advém da informação recolhida e processada em tempo real, que permite interações sucessivas com o cliente (leads comerciais), obtendo deste reações e respostas que alimentam continuamente o ciclo virtuoso do ativo informação.
Imagine-se, por exemplo, uma empresa que sabe que um número significativo dos seus clientes gosta de uma determinada marca de relógios. Poderá negociar com o fornecedor um preço de venda unitário inferior ao normal de mercado, em função duma estimativa de vendas em elevada quantidade e, inclusive, articular com uma entidade financeira uma pré-aprovação para financiamento do artigo, aquando a promoção de marketing dirigida e respetiva interação comercial de venda, em canal digital ou outro.
Assistimos pois a uma mudança profunda do paradigma de negócio, que passa de uma cultura centrada no produto para uma cultura centrada no cliente, entenda-se a sua experiência de consumo.
Os processos passam a estar estruturados em função da jornada do cliente e da simplificação de tudo o que lhe causa dor nos momentos de interação que estabelece com a empresa. Pretende-se servir o cliente em tempo-real a partir de um qualquer dispositivo.
O cliente cada vez mais pretende o acesso aos produtos e serviços das empresas numa lógica de self-service. Este acesso é realizado através da internet ou do mobile, com recurso a plataformas abertas (cloud), APIs (application program interface) ou APPs (abreviativo de application).
A distribuição digital (presença global) complementa a distribuição física (presença local). Nalguns casos, pode mesmo substitui-la na sua plenitude.
A presença física da loja, da máquina self-service e do call-center é complementada pela presença digital da internet, do mobile e da rede social. A presença humana será assegurada cada vez mais através da presença em vídeo, um fator a ter em consideração na humanização da relação digital.
O processo digital de compra incorpora o processo de pagamento. Estes são dois processos, que têm de estar presentes de forma invisível, são facilitadores da decisão de compra / fecho da venda, sem atrito e de forma segura.
Na atualidade, as empresas são primeiramente empresas de tecnologia (infraestrutura, real-time, chips, aplicações e aplicativos) em que os processos de negócio representam em si mesmo o principal negócio.
Procuram conectar a oferta e a procura para facilitar a comercialização e realização de negócios à escala global – a capilaridade digital da experiência de consumo.
As empresas estão cada vez mais preparadas para negociar peer-to-peer independentemente de ser uma pessoa singular (particular) ou coletiva (empresa pública ou privada).
A solução tecnológica de mercado para a realização de negócios com particulares encontra-se, no entanto, mais desenvolvida do que a solução para negociar entre empresas.
As principais barreiras do desenvolvimento prendem-se com questões de legislação, regulação e agilização dos pagamentos através de novas plataformas como o caso da blockchain e com questões orçamentais relativas ao custo da adaptação dos sistemas de informação para garantir o acesso, em segurança, aos processos de negócio e à informação em real time.
Finalmente, tão importante quanto as barreiras anteriores, existe uma muito importante que é a ausência de uma verdadeira cultura corporativa de inovação, onde seja permitido falhar. Nem sempre é possível quantificar em business case o retorno de uma visão inovadora de negócio. Testar, errar e corrigir faz do processo de evolução das organizações e das pessoas.
Uma plataforma aberta a terceiros requer mais investimento em segurança mas garante maior retorno. O seu valor será tanto maior quanto o número de aderentes existirem quer do lado da oferta quer do lado da procura. Alavanca-se, por esta via, o efeito da conectividade em rede das pessoas (social web) e também das coisas (internet of things). Os processos de onboarding e de engagement devem pois ser simples e seguros.
A tecnologia permite ainda estabelecer parcerias entre empresas de forma ágil potenciando o valor da inovação com recurso a soluções já testadas e validadas. Não é necessário uma empresa ser detentora de toda a solução de montante a jusante.
A economia da partilha reduz os custos de investimento e maximiza os ganhos de todos os intervenientes. A margem é efetivamente menor, por ser também repartida, no entanto, é positivamente compensada pelo rápido crescimento das vendas, pela dimensão do mercado (global) e pelo time-to-market alcançado (a tempo e em tempo).